Minhas opiniões sobre processos de mudança são a prova de que não sirvo pra coach
Experiências pessoais e intransferíveis sobre momentos de transição e ainda estou falando sobre o Web Summit Rio
Olá, humanos! Como estão os loops por aí? Nesta terceira e, provavelmente, última news sobre o Web Summit Rio, vou tentar fazer um pot-pourri de coisas que me chamaram a atenção, mas ainda não apareceram nos artigos das edições anteriores. Tem Linkedin, framework de planejamento, dicas para trabalhar dados criativamente, tudo rapidinho. Antes, porém, me deu vontade de escrever sobre processos de mudança. Mergulho em tudo isso logo depois do podcast com resumo da No-Loop passada.
Semana passada by NotebookLM:
“Pra resolver o problema do tráfego orgânico e não resolver a epidemia de solidão”
Eu estou me mudando, assim mesmo, no gerúndio, porque não é fácil nem rápido deixar o apartamento em que vivi pelos últimos, sei lá, 15 anos. Foi provavelmente por isso que algumas experiências e aprendizados sobre o tema resolveram transbordar justamente agora. Mudar é inevitável e sempre diferente. Mas tem algumas coisas - três, para ser exata - que eu encontro em praticamente todos os processos de mudança pelos quais já passei. É sobre elas que quero falar. Apesar de a proposta aparentemente se afastar do que tenho construído com a No-Loop, sinto que a reflexão pode fazer sentido tanto para quem está tentando se separar quanto para os que vivem às voltas como processos de inovação; tanto para quem quer mudar de emprego quanto para aqueles que estão reorganizando processos em função da inteligência artificial.
Assim como provavelmente todos vocês, eu já passei por mudanças das mais variadas naturezas: troca de cidade, emagrecimento radical, transição profissional, transição digital, perdas importantes, reestruturação de time e por aí vai. Colocar-se em movimento nem sempre tem a ver com saber o que quer ou para onde está indo - muito pelo contrário. As pessoas, claro, são diferentes e constróem trajetórias pessoais e intransferíveis. Mas, na minha experiência, sempre foi muito mais comum agir a partir do que eu não queria mais, sem imediata ou exata clareza do capítulo seguinte. A necessidade de um destino seguro pode fazer com que a gente se demore excessivamente em um ciclo que verdadeiramente já terminou.
A dificuldade, no entanto, é legítima - além de minha conhecida. Deixar o habitual sem saber detalhes da próxima morada exige que se sustente aberto um espaço consideravelmente ansiogênico, mas que também pode trazer autoconhecimento e possibilidades. Às vezes, eu acho que acredito demais no processo por preguiça, irresponsabilidade ou privilégio, mas daí recordo algumas das minhas próprias histórias e volto a acreditar que mudar pede equilíbrio entre determinação, coragem e paciência. Vai parecer meio esotérico para alguns, mas o universo também tem seu tempo.
Lembrei agora de um conhecido que, depois de muito resistir, resolveu começar um processo de terapia. Pois-se a ver filmes sobre os pais da disciplina e ler a respeito do assunto, na expectativa de resolver logo suas questões - ou seja, chegar. Por outro lado, adoro o conceito de slow science - não como substituta para a ciência acelerada e movida a resultados, lançamentos e publicações que temos hoje; mas como alternativa necessária. Uma das coisas que mais me encanta no termo é o fato de ele considerar que, ao refletirmos, discordarmos, errarmos e acertarmos de forma mais cadenciada, acabamos esbarrando em descobertas inesperadas pelo caminho, que por vezes podem até redefinir o objetivo original.
Está aí, portanto, a primeira consideração que me deu vontade de fazer: mudar nem sempre significa ter clareza sobre nosso próximo destino; muitas vezes o processo é motivado apenas pela certeza de que o lugar atual não nos serve mais. Será preciso sustentar aberto o espaço da descoberta.
Agora digamos que você, seu chefe, o dono da empresa, enfim, alguém com capacidade de decisão sobre o que está em questão tenha se encontrado extremamente incomodado com o estado das coisas e se visto forçado a mudar. O que pode parecer o fim de um processo de desgaste e reflexão, na verdade é o começo. A gente respira aliviado por ter tomado uma decisão sem se dar conta de que a estrada à frente reserva um desafio escorregadio, que às vezes é difícil de identificar como tal.
Fato é que o movimento da mudança inspira melhoria, esperança, o famoso “agora vai” e a gente perde de vista que ele também é feito de dúvidas, incômodos, despedidas e luto. Muitas vezes, vi iniciativas cheias de energia virarem saudade do desconforto conhecido. A memória falha, o compromisso enfraquece e, sem perceber, começamos ao voltar ao ponto de partida.
Isso não tem nada a ver com recalcular rota ou aterrissar temporariamente o avião antes de seguir viagem. É uma certa idealização do processo de mudança que não resiste ao encontro com a realidade. Falta convicção, falta conexão com o benefício e as oportunidades que podem vir.
Meu segundo ponto é que seguir em frente pode ser mais difícil do que começar. O processo tem a capacidade de se mostrar mais complexo e dolorido do que a idealização inicial nos fazia supor, ainda que você esteja se movendo para perto de algo que deseja muito.
O terceiro e último comentário é mais singelo e deriva de uma experiência bem recente. Um passo de cada vez e o caminho se faz caminhando são frases batidas e também grandes verdades, pelo menos para mim. Só que pode ser difícil decidir onde pousar o pé. Nesse caso, talvez valha a pena dividir o passo imaginado em dois menores, como forma de sair da inércia.
Em processos pessoais, você vai precisar de uma rede de apoio. Já mudanças no ambiente corporativo, dependem de um patrocínio claro e resiliente da alta liderança.
E não custa lembrar: por mais que eu ame Zeca Pagodinho, não estou engrossando o coro do "deixa a vida me levar". Embora eu nem sempre consiga enxergar quais são os meus, acho importante ter sonhos e objetivos profissionais. Só não nos esqueçamos de que a gente tem pouco controle sobre como as coisas evoluem. O caminho não é linear e vai desafiar nossa capacidade de adaptação.
(Mais) uma matriz para foresigh
A palestra da Nicole Ingra não estava entre as que favoritei no app do Web Summit. Eu me aproximei do Palco 6, dedicado a conversas sobre marketing, para assistir o talk da Melissa Jackson Parsey, da R/GA, sobre marcas em um mundo generativo. Mas aquela coisa: cheguei cedo pra garantir sentante. E um slide chamou minha atenção (sorry pela pouca qualidade da imagem):
Diretora de insights e estratégia do Ingra Labs, que ela mesmo fundou, Nicole falava sobre foresight em tempos incertos (como se não fossem todos; mas, ok, a gente entende que ultimamente a coisa anda especialmente complicada).
Eu virei planner porque pessoas com quem trabalhei identificaram esse talento e paixão em mim. Adoro fazer planejamento estratégico e, por isso, estou sempre atenta a metodologias, formatos e representações visuais que possam ajudar a compartilhar narrativas. Como no caso acima, tangibilizado abaixo pelo suposto dilema de Henry Ford.
A apresentadora chegou nessa matriz depois de resumir seu processo de trabalho (e aqui já tem conteúdo recuperado, em palestras disponibilizadas online):
É preciso ser curioso e exercitar a curiosidade
Transformar sinais em padrões
Organizar tendências (movimentos que não estão acontecendo de forma isolada e são verificados em diferentes lugares do mundo)
Investigar drives (por que isso está acontecendo?)
Criar cenários
“Uma pergunta simples ajuda muito nesse momento: what if (e se)?. E se todos de repente se sentirem seguros? E se as pessoas resolverem não sair mais de casa? E se a gente começar a confiar mais em máquinas do que em nossos amigos ou familiares?”
É esse exercício que deságua no desenho acima.
“Para mudar uma categoria e criar mercado é preciso arriscar no quadrante ‘Redefine’, que reúne possibilidades de alto impacto. Mas as empresas hoje ficam muito presas no ‘Refine’, onde o impacto é menor.”
Eu acho um acerto priorizar a partir do impacto, embora saiba que isso não é fácil. Normalmente, envolve mais risco, mais pesquisa, mais tempo. É tão interessante que essa semana me vi trazendo essa abordagem para o presente, a partir de uma primeira conversa com um possível prospect.
Apesar de nova, a empresa nasceu com centenas de milhares de clientes. Tem desafios em cultura, branding, produto, tecnologia, comunicação, you name it. Vai ser preciso mais do que conhecimento técnico para atender de forma eficiente. Vai ser preciso experiência e sensibilidade, para lidar com diferentes entendimentos sobre o papel do marketing, diferentes urgências e estilos. Além disso, claro, priorizar, estabelecer um trabalho faseado. Como? Filtrando sempre pelo que tem potencial para causar mais impacto.
Enfim, matrizes são recursos muito legais para organizar pensamentos, assim como também são os mapas mentais - mas sobre eles a gente fala outro dia. Aliás, o pot-pourri que eu prometi também ficará para outra vez, já que acabei me estendendo no primeiro item dele.
Até a próxima, pessoal! Boa semana a todos.